Aproximação ao conceito de capital social

O presente trabalho debruça-se sobre a questão do capital social no sentido de tentar precisar e entender o seu conceito, dimensões e variáveis, para melhor poder perceber a sua utilidade e aplicações práticas, na sociedade e suas organizações.

Tendo sido Karl Marx um dos primeiros teóricos a fazer um estudo sistemático da definição de “capital”, fomos ver o que a este propósito disse, pelo facto de se manter alguma polémica em determinar se capital social, deve ou não, ser considerado um capital.

Karl Marx afirma que o capital não se compõe somente de meios de formas de vida, instrumentos de trabalho e matérias-primas, compõe-se também de medidas de troca. O capital é, em sua opinião, uma súmula de produtos materiais, mercadorias, valores de troca e magnitudes sociais. Acrescenta que só aumenta com a força de trabalho. E que o capital tanto pode ser acumulado como depreciado. Já na altura Karl Marx falava em magnitudes sociais.

Interpretamos estas magnitudes como extensões e grandezas, dos factos sociais que podem permitir chegar às questões agora levantadas com o novo conceito de capital social, que de acordo com os autores consultados, se afigura como um sub conceito de capital.

Samuelson, refere que, qualquer capital tem uma zona de incerteza e risco. As taxas de rendibilidade dependem do valor retornado. Nem sempre as expectativas se cumprem e têm que ir sendo permanentemente ajustadas. Podem existir riscos de investimento não seguráveis. Vamos reter desta definição o problema das expectativas poderem não se cumprir, apresentando uma zona de incerteza e risco, que, como veremos, poderá sempre acontecer com o capital social.

Ao longo do nosso estudo fomos verificando que estas questões são inerentes à noção de capital social, e que dada a sua incerteza, têm vindo a provocar estudos, de forma sistemática, para viabilizar a sua aplicação.

Mas considerando, ainda, só, o capital como um conceito económico, se é que o podemos fazer, levantamos, também a questão dos lucros de investimento.

Este problema, também se pode colocar, ao pensarmos em capital social, mas, como pensamos verificar, há no capital social um causal de “reciprocidade” normalmente equitativo. Se assim não for o “investimento” em capital social, através desse canal, tenderá a deixar de se fazer. Pelo que, em relação aos lucros directos do capital social, eles não serão comparáveis com os lucros resultantes de uma transacção de capital económico.

Vamos, também, apurar como alguns autores entendem, que o capital social, tanto pode ser depreciado, como acumulado, considerando implícitas no conceito, externalidades positivas e negativas (Francis Fukuyama), o balanço de laços fortes e laços fracos, nas redes ou grupos (Mark Granovetter) e a questão da reciprocidade (James Coleman).

A noção de capital social é trazida para os estudos e observações das Ciências Sociais pela mão de investigadores como Pierre Bourdieau, Robert Putnam, James Coleman, Henrique Rattner, Francis Fukuyama, Stiglitz, prémio Nobel da Economia, Amartya Sena, outro prémio Nobel da Economia (1998), anterior a Stiglitz, entre muitos outros investigadores, relevantes e conceituados e que não incluímos, para não formar uma demasiado dilatada, lista de nomes.

Tentámos ter o cuidado de revelar autores de tendências ideológicas diferentes. Notando, que, no que foi a razão do nosso estudo, as suas posições não são oponíveis, muito antes se completam.

A partir dos anos 90 dá-se um boom de proliferação da investigação ligada ao tema. Entre outras, Organizações Internacionais, como o Banco Mundial, de 1995 para cá, a OCDE, a FAO e CEPAL , passam a empenhar-se no estudo do capital social.

A preocupação subjacente é marcada pela distância que separa pobres de ricos e pela melhoria das performances sociais e económicas dos indivíduos, comunidades, organizações e redes.

O desenvolvimento económico, como uma questão universalmente considerada, é questionado, e referido, como uma imposição uniforme, a sociedades com realidades muito divergentes. E neste contexto o capital social aparece como um conceito que pode trazer alguma esperança para um desenvolvimento económico equilibrado, pondo-se com especial acuidade o desenvolvimento local e regional.

A principal razão para o surgimento do tema, segundo Carlos Milani, prende-se com o facto de a maioria destes autores, pioneiros no estudo do capital social, considerar que as variáveis, normalmente utilizadas em Economia, são insuficientemente eficazes para produzir desenvolvimento social. A verdade é que são já muitos, os economistas que deixaram de considerar a questão como uma externalidade, que serve para “corrigir imperfeições no mercado” e antes passaram a integrar o tema no seu campo de estudos.

Hoje, a questão é estudada por investigadores da Ciência Política, Economia, Sociologia e Antropologia. Começam também a aparecer textos relacionados com a questão do capital social e o Direito, sobretudo em questões mais ligadas às políticas públicas.

De acordo com Alejandro Portes o conceito de capital social pode ser directamente aplicado no controlo social, apoio às famílias e nos benefícios familiares. Indica também que, estudos mais recentes alargam o conceito de uma escala individual para um campo de acção característico de comunidades e nações.

Nos últimos anos, foram feitos muitos estudos, sobre o capital social. Do ponto de vista metodológico, faz-se actualmente, um estudo hercúleo no sentido de medir as propriedades de conceitos de variáveis instáveis, tais como: confiança, rede e comunidade, entre outras. Procuram-se descobrir indicadores sobre capital social. E é de registar que existem já métodos de medição, para o conceito, altamente sofisticados.

Kliksberg, um outro estudioso do capital social, sociólogo, que dirige a Iniciativa Interamericana de Capital Social, Ética e Desenvolvimento do BID – Banco Internacional do Desenvolvimento – Nações Unidas, afirma que algumas medidas econométricas, já realizadas, são concludentes em relação aos resultados positivos da sua aplicação nos actos sociais. Quanto mais capital social, mais crescimento económico a longo prazo, menos criminalidade, mais saúde pública e mais democracia.

Os autores, tidos consensualmente como os primeiros investigadores que abordaram a questão, fizeram-no, ainda assim, valorizando variáveis diferentes.

Pierre Bordieau é considerado como sendo um dos primeiros autores a sistematizar a noção de capital social em 1986. Entende, que o capital económico, que corresponde a trabalho humano acumulado, é a base de todos os outros capitais: cultural e social. No seu entender, existe uma circularidade entre os vários tipos de capital, que leva à intercambialidade das suas diferentes formas. Em sua opinião, é a partir do capital social que os actores sociais podem ter acesso directo aos recursos económicos.

Este autor entende que o conceito de capital social corresponde ao “agregado dos recursos efectivos, ou potenciais, ligados à posse de uma rede durável de relações, mais ou menos institucionalizadas, de conhecimento ou reconhecimento mútuo.”

James Coleman equacionou o problema das obrigações recíprocas, canais de informações e normas sociais, para poder explicar o fenómeno. Com Putnam, vemos levantada a questão do “ordenamento das organizações sociais”, através da confiança, normas e redes, engajamento cívico e comunitário.

Francis Fukuyama entende que o capital social se expressa de formas corpóreas que é preciso desenvolver. Considera que pode desempenhar um papel basilar na sociedade. E, um dos aspectos que muito trabalhou, foi o problema do voluntariado e direito ao não trabalho. Refere que, em países desenvolvidos, o voluntariado representa mais de 5% do Produto Bruto, em bens e serviços sociais.

O Banco Mundial e o Banco Interamericano do Desenvolvimento e as Nações Unidas, entre outros criaram áreas dedicadas a promover o capital social, tal a importância efectiva que já lhe reconheceram.

O conceito de capital social, tem já vindo a ser aplicado em estreita relação com a criação de redes de associativismo e corporativismo, que permitem e fomentam a colaboração entre os indivíduos. Tem também sido aplicado em estratégias de Desenvolvimento Económico. Nomeadamente, relacionadas com o poder regional e local. Têm, ainda, sido notados os seus benefícios junto da integração de grupos minoritários ou excluídos.

Quanto ao nosso tema, decidimos delimitá-lo a um campo de definição metodológico, por nos termos apercebido que grande parte das publicações ainda se centra à volta deste problema, dado ser reconhecido ao conceito, alguma imprecisão e instabilidade, sobretudo pela Economia.

Em termos da organização interna do nosso trabalho, decidimos fazê-la em três partes, definidas pelos nossos temas principais, e posteriormente, divididas em sub temas. A primeira parte é dedicada à introdução e índice, com uma organização que segue uma lógica cronológica. Daqui segue-se para a parte dois, com a explanação das visões dos autores, tidos como fundamentais, na criação do conceito, tentando indicar algumas das suas dimensões.

A parte três desenvolve-se com a exposição da relação entre capital social e redes, formais e informais, e normas de confiança, factores que são apresentados como algumas das variáveis do conceito de capital social.
Seguem-se as considerações finais, onde se resumem as questões consideradas essenciais, dos nossos três capítulos. A lista bibliográfica foi construída só com as fontes a que fizemos referência no trabalho.

Objectivos

Foi nosso propósito melhor conhecer e perceber o tema, por nos parecer actual, e pertinente. A sua temática científica, interdisciplinar, situada entre a Economia, Sociologia, Antropologia e Ciência Política, despertou-nos muita curiosidade. A interdisciplinaridade é considerada, por algumas comunidades científicas, a forma mais abrangente e eficaz de abordar factos sociais transversais às várias disciplinas. Foi nosso objectivo estabelecer a comparação das diferentes perspectivas do capital social através de distintos autores. Tentámos através deles alcançar alguma ordem metodológica.

A razão da nossa escolha prende-se com o facto de reconhecermos ao tema uma grande actualidade, que se poderá dever a um o estado actual de algumas sociedades, ditas desenvolvidas, que parecem encontrar-se agora mais votadas ao individualismo e com algumas das bases corporativas em ruptura.

Queremos julgar, que a conciliação das diferentes perspectivas disciplinares, poderão ser analogamente importantes. Todas poderão vir a contribuir para um melhor conhecimento do fenómeno, das suas dimensões e aplicações, nas sociedades e suas estruturas organizacionais.

Tentámos, de todo, não esquecer a lógica da resistência de alguns economistas ao conceito, que se tem preocupado em precisar as suas medidas com vista a uma aplicação viável na sociedade. Não esquecendo que por ter nascido, na sociologia poderá apresentar um raciocínio sobre socializado.

Ao iniciarmos este estudo deparámo-nos com algumas dúvidas que tentámos resolver. A primeira foi:

– O conceito de capital social é um conceito homogéneo, consensualmente reconhecido pelos investigadores? Quais são as suas variáveis?

A outra pergunta esteve relacionada com o facto de a alguns economistas, se levantar a questão, de o capital social não dever ser considerado como um capital em termos económicos.

Metodologia

Para este trabalho fizemos um estudo realizado através de publicações, em livro, revistas da especialidade, e ainda através da Internet, dada a sua actualidade.

Tivemos, também, algumas conversas com um investigador, de Antropologia, a fazer doutoramento, no ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão, em capital humano.

Recorremos muito, na investigação do tema à consulta na Internet, onde proliferam largas centenas de sites que abordam o assunto de forma mais ou menos detalhada, com especial incidência dos brasileiros e americanos. No Google apareceram-nos cerca de trinta mil páginas (acesso em trinta de Janeiro de 2004), tendo em conta as palavras-chave: capital social – crescimento económico, uma variável fortemente relacionada, em alguns dos autores consultados, com capital social.

A sete de Fevereiro de 2004, encontrámos, com as palavras-chave: capital social – medidas, cento e trinta e quatro mil páginas.

2 Percurso de aproximação ao conceito de capital social

2.1 Pierre Bordieau

Pierre Bourdieau, sociólogo francês, foi um dos primeiros a apresentar o conceito de forma sistemática. No seu artigo “Les formes de capital” de 1986, sugere, que o capital se pode converter de umas formas para outras. Estabelece diferenças entre as formas económicas, culturais e sociais , ilustrando como é que elas se distinguem.

Entende que as formas de capital podem ser distintas, de acordo com a forma como são transmitidas. Quanto ao capital social, identifica-o como “o agregado dos recursos reais ou potenciais, de uma rede, mais ou menos institucionalizada, de conhecimentos e identificações mútuas.”

Quanto à mensuração do capital social de um agente, Pierre Bourdieau, certifica que depende da extensão da rede de conexões, de conhecimentos, que ele pode movimentar. Esses movimentos serão efectuados de forma eficaz, sobre o capital (económico, cultural ou simbólico) daquele a quem o agente se conecta. O conectado, por sua vez, é alguém que possui esse capital por direito próprio.

Bourdieau considera que as formas de capital se reduzem, em última instância, todas, à forma de capital económico. Através do capital social os actores acedem directamente a recursos económicos como: empréstimos subsidiados, informações acerca de negócios e mercados protegidos.

O autor estudou também os benefícios que os actores podem retirar quando recorrem ao capital social. Identifica, como um dos benefícios, o aumento do capital cultural através do contacto com pessoas cultas e especialistas. Outras vezes as pessoas procuram a filiação em instituições credenciadas que agregam capital cultural, de forma a poderem ter acesso a esse mesmo capital. No primeiro caso identifica o capital como incorporado, e no segundo, como institucionalizado. Dá estes exemplos para identificar a conversão do capital social em capital cultural.

Este sociólogo francês indica que as trocas relativas a capital social têm características próprias. São normalmente estabelecidas de forma tácita, por tempos de reciprocidade incerta e com o conhecimento da possibilidade de a troca mútua não ser cumprida.

Bourdieau, à semelhança de Coleman, estudou o conceito numa perspectiva individual. Dois elementos distintos constituem o capital social, de acordo com Bourdieau. O primeiro, constitui-se a partir do conjunto das relações que disponibilizam, aos intervenientes no grupo, a possibilidade de reivindicar os recursos comuns. O segundo elemento identifica-se na medição da quantidade e qualidade dos recursos trocados. O capital económico que se faz representar no trabalho humano acumulado é sempre a base dos outros capitais.
O conceito de capital social acabou, no entanto, por se estender para grandes agregados, com Putnam como um dos mais proeminentes estudiosos e defensores desta abordagem.

2.2 Granovetter e “a força dos laços fracos”

Mark Granovetter é uma grande figura da Sociologia Económica. Coleman baseou-se muito no estudo feito por Mark Granovetter para a sua definição de capital social, razão pela qual, aqui decidimos incluir uma pequena passagem pela sua teoria dos laços e “social embeddedness”.

Defende que toda a acção social está embutida – “ social embeddedness ” – numa teia de relações e redes sociais. Aproveitando, com isso, para apresentar uma perspectiva crítica à visão sub – socializada, de alguns autores, em boa parte na área da Economia, que elimina todas as relações sociais.

Estende o mesmo raciocínio lógico, de crítica, para a visão sobre – socializada, típica de boa parte do pensamento sociológico, onde se interpreta o comportamento dos agentes, de acordo com um “determinismo de previsão” estudado para o seu grupo social.

Este cientista propõe que se acabe com esta abordagem dicotómica e se passem a perceber as acções dos agentes económicos numa óptica “enredada” ou “embutida”, pois os agentes, encontram-se organizados em redes de relações sociais, que são base importante das relações económicas. É seu entender que a análise de transacções económicas entre os actores sociais não pode ser retirada do contexto social. A confiança é uma fonte de capital social que afecta os custos de transacção dos negócios. O capital social vai, assim, centrar-se na estrutura formal dos laços, em observância de uma fonte estrutural, ou nas relações que se formam dentro de uma rede social, em execução de uma estrutura relacional.

Mark Granovetter estudou, também, a natureza dos laços de ligação entre os indivíduos, que se estabelecem dentro das redes. Identificou dois tipos de laços diferentes: os laços fortes e os laços fracos. Os laços fortes pressupõem muito tempo dedicado à relação, envolvimento emocional, confiança e reciprocidade. Moldam-se e auto-reforçam-se ao longo do tempo.

Um laço fraco pressupõe relações pontuais entre os agentes. A identidade dos indivíduos tem aqui, menos importância, e a confiança e reciprocidade são mínimas.

O que é trazido de novo com esta teoria, é que, Granovetter chama a atenção para o facto, de este tipo de laços, fracos, contrariamente ao que até aqui seria usual pensar-se, permitir gerar mais informações novas, que dão mais valor acrescentado às relações dos indivíduos.

Este investigador entende que, os laços fortes, ao longo do tempo, perdem a sua funcionalidade. Podem, em seu pensamento, ocorrer ossificações, neste tipo de ligações. Com os laços fortes, as contendas pessoais acabam por se sobrepor às questões de eficiência, tornando-se a possibilidade de inovação, para as partes, cada vez menor.

Esta questão vai, posteriormente, ser aprofundada, por Ronald Burt, da Universidade de Harvard, em 1992, a propósito de um estudo das redes de empresas.

2.3 A abordagem de Colleman

James Colleman deixou-se influenciar, como acima referimos, por Granovetter para fazer o seu estudo sobre capital social. Trabalha com o conceito de capital social numa perspectiva individual e das escolhas racionais.

Confronta a questão, com a capacidade de relacionamento do indivíduo, com a sua rede de contactos e expectativas de reciprocidade. Isto é: um indivíduo ajuda outro e espera dele a mesma disponibilidade, numa outra altura em que, ele, ou alguém das suas relações, venham a precisar.

James Coleman refere-se a comportamentos fiáveis durante o processo da troca de recursos entre os actores. Diz que estes comportamentos melhoram a eficiência dos indivíduos em sociedade, aumentando a coesão social, a obediência às leis e normas sociais, acabando por criar um predomínio vantajoso da cooperação sobre a competição, em todos os actos da vida pública.

Coleman, parte da teoria das escolhas racionais, para a sua explicação do conceito de capital social, revelando que os actores sociais agem racionalmente para atingir os seus fins, procurando obter um máximo de resultados favoráveis, aos seus objectivos, com um mínimo custo.

O seu conceito de capital social permite compreender como se dão as relações de confiança, que em sua opinião, são favoráveis à acção colectiva organizada. Nos seus estudos, capital social, assumiria as seguintes formas: obrigações e expectativas, confiabilidade das estruturas, canais de informação e normas sociais.

Para James Coleman o capital social sofre depreciação se não for constantemente renovado. A criação, manutenção e destruição de capital social dependem de relações de confiança e proximidade.

Para explicar as razões que levam os actores sociais a praticarem “favores” a outros, Coleman indica que estes entendem, que, em princípio, os agora favorecidos, retribuirão. Basta esperar pela altura de serem os prestadores de favores a requerer a troca.

Colleman lembra, que na maior parte das vezes, esta troca exige pouco dispêndio de tempo, ou outro tipo de disponibilidades, mas, mesmo quando assim não é, e envolve, citando como exemplo, empréstimos de dinheiro, essa troca, não se deixa de efectuar.

Esta permuta de favores, baseada na perspectiva da igual disponibilidade das partes, para dar e receber, é a essência daquilo a que Coleman chama as normas de “reciprocidade”, que pressupõe obrigações e expectativas, canais de informação e confiabilidade, bases fundamentais para poder existir capital social.

2.4 A perspectiva macro-estrutural de Robert Putnam

O conceito de capital social tem vindo, para além da abordagem individual, a estar muito ligado às questões do desenvolvimento regional e local. Robert Putnam, Professor de Políticas Públicas da Universidade de Harvard, estudou os diferentes aspectos que caracterizaram as diferenças regionais entre o norte de Itália e o Sul que apresenta grandes disparidades e diferenças a nível regional.

Ao estudar as diversas comunidades regionais, chegou à conclusão que as suas diferentes características vão determinar resultados dissemelhantes ao nível social e económico.

Fundamenta-se no conceito de capital social para justificar os diferentes resultados em termos de desenvolvimento económico. Para Robert Putnam capital social define-se a partir das características de uma organização social: redes, relações, normas de comportamento, valores, confiança, obrigações e canais de informação.

Na sua perspectiva, quando o capital social existe permite uma série de acções colaborantes que se transformam num benefício para toda a comunidade.
Acrescenta, que, os factores sócio-culturais, exemplificando com tradições cívicas, capital social e práticas corporativas desempenham um papel muito importante nas diferenças regionais. Sendo a tradição comunitária uma prática de excelência que faz emergir a fidelidade nos negócios.

Numa sua investigação, sobre o declínio mundial do empenho cívico dos cidadãos na sociedade, afirma que se verifica um cada vez maior isolamento individual, sobretudo nas camadas mais jovens. Acrescenta que o desligamento dos cidadãos americanos, das organizações cívicas é cada vez maior. Sita, como exemplo, o desprendimento das organizações locais, instituições de caridade, igrejas, e até das assembleias de voto. Indica que mesmo nas famílias, o isolamento é cada vez maior, tendo vindo a notar-se um acentuado declínio da confiança nos outros.

Putnam, num seu artigo, publicado em 2003, no jornal inglês “ The Observer”, refere que a preocupação, com o capital social, não é uma forma de nostalgia, mas antes, o reconhecimento do seu valor apreciável.

Para Robert Putnam as comunidades com mais capital social têm taxas de criminalidade mais baixas e escolas mais eficientes. Transpondo estes problemas para a Europa, considera que esta tem vindo a seguir os passos dos americanos, ainda que não esteja no estado de “doença social” instalado nos USA.

Na Europa, Putnam, afirma que a frequência das igrejas passou para metade do número de 1970 e que, na Grã-Bretanha, essa queda se fez acompanhar de um declínio da confiança nos outros. Em seu entender, a confiança é um dos indicadores mais sensíveis do capital social. A confiança vai ser identificada mais à frente como uma das variáveis de difícil mensuração no conceito, ora apresentando correlações positivas, ora negativas.

Relativamente aos sindicatos e partidos políticos, indica o mesmo tipo de desvinculação dos cidadãos, que entende como preocupante. Pois, Putnam considera que, qualquer uma destas instituições é um campo de preparação cívica.

Para que não haja um défice de capital social, nas sociedades, parece-lhe importante que se fortaleçam os laços comunitários, dando como exemplo o que foi feito pelos reformadores sociais da era vitoriana, no Reino Unido, onde se assistiu a uma “explosão de criatividade social”, que em muito beneficiou as comunidades.

A este propósito, acrescenta a necessidade de flexibilizar os locais de trabalho para que os cidadãos possam conciliar as necessidades profissionais com as da família e da comunidade, apresentando-se esta solução como um facilitador para a existência de capital social.

Robert Putnam conclui que se observa uma crise da comunidade, a qual, para ser combatida, necessita da conjugação de esforços da sociedade americana e europeia, pois foi aqui que se centrou o seu estudo.

2.5 A acessão de Francis Fukuyama

Fukuyama, é Professor de Políticas Públicas na Gerorge Mason University – USA – e também tem estudado o capital social. De acordo com o que já referimos na nossa introdução, julga que o capital social se revela de formas materiais que é preciso incrementar.

Considera que o capital social pode desempenhar um papel essencial na sociedade. Um dos aspectos que muito trabalhou foi o problema do voluntariado. Publicou outros artigos onde indica o direito ao não trabalho, como uma forma de comportamento social que não deve ser considerada negativa.

Num seu trabalho Social capital: The problem of Measurement, diz que o capital social se revelou uma condição essencial para uma transição para democracias estáveis na Europa ocidental. Na sua perspectiva, nos USA o declínio do capital social tornou-se um problema muito sério para a democracia.

Fukuyama explica-nos que só as boas condutas produzem capital social. Os valores errados não. Portanto, considera que as normas para produzirem capital social devem incluir valores como: confiança e obrigações de reciprocidade.

Estas normas, que produzem capital social, podem ser partilhadas e distribuídas de diferente maneiras, mas, ao longo de números limitados de grupos das sociedades. Pois há grupos em que as normas de obrigações e reciprocidade não se disseminam.

Refere que as famílias são evidentemente um tipo de grupo que constitui fonte essencial de capital social, por todo o lado. Indica, porém, que o tipo de família difere de sociedade para sociedade.

Francis Fukuyama lembra Weber quando este chamou a atenção para a necessidade de encorajar a honestidade e a reciprocidade nos indivíduos.
Fukuyama indica que se descobrem três problemas na medida do conceito de capital social. E afirma, que o fenómeno se apresenta como uma medida qualitativa a dimensionar quantitativamente.

Identifica, o primeiro problema de dimensão, na determinação do grau de coesão do grupo. O segundo, na determinação do grau de externalidades positivas, entre os membros do grupo, acrescentando que, não é fácil conceber e identificar uma externalidade positiva.

O terceiro, e último problema, está relacionado com as externalidades negativas. E exemplifica com o facto de alguns grupos promoverem a intolerância e mesmo a violência dirigida para os elementos que não pertencem ao grupo.

2.6 Síntese das componentes e dimensões mais correntemente definidas no conceito

A acepção de capital social, de Bordieau (1986), indica uma agregação de uma trama potencial, definida no tempo, ligada à posse de relações e redes sociais, que podem ser mais ou menos institucionalizadas.

Esta definição parece poder ultrapassar algumas questões levantadas por outros autores, que se prendem com a sua conceptualização e a sua dificuldade posterior na aplicação do conceito.

Se tivermos em consideração as críticas de Fukuyama observamos o seguinte: Fukuyama critica Putnam, em “Bowling Alone”, por entender que Putnam, não considera, que tanto existe condições que promovem a confiança, como outras que não. E isto, por si, vem a tornar difícil a medição do conceito. Pelo que procurámos um conceito que tivesse implicado a ideia de transacção temporária, por um lado, e expressasse o não retorno, a não reciprocidade, como uma faculdade, menos comum, mas possível, do capital social.

Se tivermos em conta a definição de Michael Woolcook: “Capital social refere-se às normas e redes que facilitam a acção colectiva”. Verificamos que, aqui, a reciprocidade parece ser a primeira condição para que capital social se verifique. Considerando-a com valor positivo, se se realiza a troca nos dois sentidos. Não considerando o resultado negativo, se o favor se realizar só num sentido, sem reciprocidade.

Em nossa opinião, a noção de Pierre Bordieau, ultrapassa esta contenda, levantada por muitos autores, como factor de incredibilidade do conceito, por indefinição. Na sua definição, este factor, pode ser positivo ou negativo, pois Pierre Bourdieau fala de uma “trama potencial”, admitindo a possibilidade “virtual” da realização ou não da troca. Faz também a inclusão do factor tempo, dando um sentido mais evidente à variabilidade do conceito, quando indica que a trama potencial é “definida no tempo”.

Bordieau refere três formas de capital: económico, cultural e social. Nesta questão que, se nos assemelha, não ser de somenos importância para compreender a significância do conceito, num contexto interdisciplinar, adoptamos a identificação dos diferentes tipos de capital, segundo o estudo dos economistas do Banco Mundial.

Alguns estudos de economistas do Banco Mundial referem quatro formas de capital: o capital natural, constituído pelos recursos naturais. O capital físico, construído pela sociedade, referente a máquinas, equipamentos e o sistema financeiro. Uma terceira forma de capital seria, nas suas perspectivas, o capital humano resultado directo do nível de educação, saúde e acesso à informação da população. A quarta forma de capital seria a do capital social que, em seus entendimentos, reflecte uma forma nova de análises e propostas de desenvolvimento.

Esta identificação dos diferentes tipos de capital, feita pelo Banco Mundial, é, em nossa percepção, mais precisa. E tem a valia, de, definida por economistas, afastar a pendência um pouco polemizada, para considerar o conceito de “capital” um conceito estrito da economia, onde não cabe a dimensão de “social”. Percebendo, esta corrente económica, o capital social como uma externalidade da economia, que não se comporta como um “capital”.

Em nosso entender, o conceito de capital social não aspira a comutar os pesos dos factores económicos no desenvolvimento. Antes evoca a necessidade de lhe anexar novos factores, provenientes do estudo de outras áreas disciplinares científicas.

Parece-nos que podemos identificar, de acordo com Coleman (1988, 90), as principais componentes, ou elementos do conceito, nos seguintes actos sociais: obrigações e expectativas, confiabilidade das estruturas, canais de informação e normas sociais.

Quanto às dimensões do conceito, segundo a perspectiva de Putnam, crescerá ao longo, de pelo menos quatro dimensões, que serão: os valores éticos dominantes na sociedade, a sua capacidade associativa, o grau de confiança entre os seus membros e a consciência cívica.

3 Relação do conceito com as suas variáveis

3.1 Capital social e redes sociais

As redes de relações facilitam o espaço para a troca de informações entre as pessoas, criam espaços para a comunicação, com canais de informação e trocas de conhecimentos.

Quando entramos no domínio das variáveis do conceito de capital social, deparamo-nos com a questão quer a nível individual quer a nível dos grandes, ou pequenos agregados. Se tivermos em conta a capacidade associativa dos indivíduos, teremos que acabar por ir verificar e estudar os motivos que levam à criação de redes e relações sociais, a partir das quais os actores sociais se agregam.

De acordo com Jacob Carlos Lima, o capital social tem sido amplamente utilizado na sociologia norte-americana, para comprovar a evidente utilidade das redes sociais informais, na construção de formas de sociabilidade, em que se conjugam interesses individuais e colectivos.

Segundo Sérgio Lazzarini há uma relação directa entre o capital social e a “habilidade” das empresas ou dos agentes para gerar valor a partir das redes e relações sociais em que se inserem. Será, então, importante perceber a capacidade dos cidadãos para se relacionarem.

3.2 Capital social e redes das empresas

Fernando Curi Peres faz uma relação directa do desempenho da empresa com a sua capacidade para procurar informação e conhecimentos na rede de organizações em que se insere. Refere-se a uma estratégia empresarial corporativa, que acontece quando as relações entre empresas são estruturadas e feitas ao longo do tempo.

Mas o autor, à semelhança da análise de Mark Granovetter, que estabelece uma diferença quantitativa e qualitativa entre os laços nas relações, também lembra que, transacções continuadas, com as mesmas empresas, podem fazer reduzir o desempenho das organizações.

Chama-lhe o efeito de “sobre-socialização”. Neste caso, as questões políticas e afectivas, podem prevalecer e sobrepor-se a uma estratégia de eficiência que dite outras escolhas de alianças e projectos.

De acordo com um estudo de Brian Uzzi, realizado nos USA, o desempenho das empresas foi manifestamente influenciado por laços não redundantes. Identifica laços não redundantes, como aqueles que são estabelecidos entre duas redes diferentes por um indivíduo, sem que, mais nenhum outro agente das duas redes possua laços entre si.

Isto poderia indicar que, as transacções económicas nas empresas deviam passar a ter um carácter impessoal, medida com que sairiam favorecidas. No entanto, parece dever acrescentar-se, de acordo com este estudo, que a estratégia a escolher, deverá passar pela equação dos dois tipos de laços. Os laços fortes, não deveriam ser abandonados, pois seriam muito importantes para o desenvolvimento da confiança mútua , sustentando a possibilidade de um melhor cumprimento dos contratos. Enquanto que, os laços fracos trariam valor acrescentado ao conhecimento e capacitações novas.

Manuel Castells, professor de sociologia e planeamento urbano, diz-nos que as formas de organização económica, não evoluem dissociadas do todo social, muito antes pelo contrário, criam raízes entre as instituições, culturas e sociedades em que se desenvolvem. Estabelece uma relação directa entre a organização económica e o todo social.

Aponta um estudo, relativo aos sectores automóvel e electrónico, sobre a sociedade em rede e, refere, a propósito das empresas multinacionais e transnacionais, em que se revela a sua forma de organização em redes.

São identificados cinco tipos de redes diferentes: Redes de fornecedores, redes de produtores, redes de clientes, coligações de padronização e redes de cooperação tecnológica, que acordam entre si padronizações globais de modelos, que permitem a partilha de conhecimentos científicos e de I&D, genéricos. As redes parecem concentrar-se em torno de uma grande empresa multinacional onde se desenvolvem bases de alianças e cooperação. Este é um estudo para os grandes agregados.

Já Alejandro Portes, entende que a maior promessa do capital social se encontra na sua acepção individual. Do ponto de vista, de uma acrescida escolha, de transposição para grandes agregados, este investigador, considera ser muito importante exercer o estudo com muito rigor e requinte teórico.

Mas, podemos ir verificando ao longo deste estudo, que capital social, à semelhança de qualquer outro capital de acordo com Samuelson, tem riscos de investimento não seguráveis e zonas de incerteza e risco. Contudo as normas sociais e redes que se constituem servem para colmatar as zonas de incerteza, tornando-o num capital de investimento mais seguro.

3.3 Normas de reciprocidade e confiança

À semelhança das redes, também as normas de reciprocidade e confiança, estão directamente interligadas com o conceito de capital social. Sendo para alguns autores, variáveis fundamentais do conceito.

Estas normas, far-se-iam representar por um conjunto de obrigações mútuas, entre as pessoas, que se tornam facilitadores da actividade produtiva.

Estas acções podem ser identificadas com carácter de positividade ou negatividade de acordo com a posição e interacção do indivíduo na rede. No cálculo final, biunívoco, a qualidade e quantidade dos benefícios trocados, é que determina se a conexão resultou em factor positivo, ou negativo.

Estar fora das redes é um factor negativo de determinação de capital social, pois, a estrutura da rede, tende a defender os seus elementos e a limitar o acesso aos outros. São bases de solidariedade que tornam os recursos de trocas, possíveis e, que advêm do facto do indivíduo participar num grupo.

Dois elementos distintos constituem o capital social, de acordo com Bourdieau. O primeiro constitui-se a partir do conjunto das relações que disponibilizam, aos intervenientes no grupo, a possibilidade de reivindicar os recursos comuns. O segundo elemento identifica-se na medição da quantidade e qualidade dos recursos trocados. O capital económico, que se faz representar no trabalho humano acumulado, é sempre a base dos outros capitais.

Nas relações, entre os indivíduos do grupo, subentendem-se normas de confiabilidade que permitem imaginar, à priori, que as obrigações de uns, com os outros, são pagas. Estas normas são o garante de permissão para manter as conexões entre os indivíduos. Geram-se, no entanto, graus de confiança diferentes que fazem aumentar os riscos de aplicação do capital social.

O capital social, parece estar, também, em termos de normas de confiabilidade, relacionado com a estabilidade das instituições. Para que haja estabilidade, dessas instituições, nota-se uma tendência para criar normas que permitam regular a sua manutenção. Dão-se como exemplo a declaração de insatisfação perante comportamentos, a sua repressão, inibição e as sanções posteriormente aplicadas.

De acordo com Coleman a confiança resulta das normas de reciprocidade e, fazem-se representar no sistema social, através de processos de socialização e sanções, explícitas ou implícitas. Bruno Pinheiro W. Reis ajuda-nos a perceber melhor o fenómeno, deixando antever a possibilidade de a confiança ser uma variável de um modelo conceitual de capital social. E foi assim que considerámos neste estudo.

Assemelha-se-nos importante aditar que a aplicação de capital social não deverá ser atrapalhada com a noção de socialização, confiança mútua, ou relações de longo prazo. A sua aplicação, antes deverá envolver, um complexo cálculo ponderado de laços fortes e laços fracos. Facilitando os primeiros o desenvolvimento de relações estáveis e confiança mútua, e os últimos, as informações e capacitações novas.

4 Considerações finais

O conceito de capital social, de acordo com Pierre Bourdieau, que nos parece ser o autor que apresenta uma definição mais abrangente e precisa, será: “o agregado dos recursos reais ou potenciais, de uma rede, mais ou menos institucionalizada, de conhecimentos e identificações mútuas.”

De acordo com este trabalho, parece-nos que, a questão que se levanta, em volta do problema, de, o capital social, poder ser considerado como um capital em termos económicos, se prende com medidas que possam vir a permitir pensá-lo como uma fonte de investimento com taxas de retorno mensuráveis que venham a permitir fazer aplicações programadas. Nota-se que, esta análise deve ser sempre ponderada com alguma cautela, se se considerar que a sociedade não deve ser nunca excessivamente reguladora, considerando algumas correntes de pensamento filosófico e sociológico.

Não nos parece ser contraditória a ideia de aplicar a concepção económica de “capital”, ao recente conceito de “capital social”, pelo facto de este, assim se puder tornar numa medida à qual se pode aplicar alguma previsão rigorosa.

E verificámos, que já na altura, Karl Marx, falava em magnitudes sociais quando se referia a capital. Interpretamos estas magnitudes como extensões e grandezas, dos factos sociais que podem permitir a abertura de um terreno propício à formação desta ideia de capital social.

Para os economistas, as dúvidas metodológicas parecem ser, um pouco mais evidentes. Sobretudo do ponto de vista da fiabilidade das suas medidas. Estas questões, de natureza prático-cientifica, prendem-se com a consideração consensual em relação ao comum dos autores, de uma definição estável do conceito, que pressuponha um perfeito conhecimento das suas componentes, dimensões e variáveis.

Quanto à mensuração do capital social de um agente, Pierre Bourdieau, certifica que depende da extensão da rede de conexões, de conhecimentos, que ele pode movimentar. Esses movimentos serão efectuados de forma eficaz, sobre o capital (económico, cultural ou simbólico) daquele a quem o agente se conecta. O conectado, por sua vez, é alguém que possui esse capital por direito próprio e que está potencialmente disponível para efectuar a troca.

Durante o processo da troca de recursos, entre os actores, podem levantar-se problemas de confiança que, ora funcionam como facilitadores, ora impedem este acto social. Podendo fazer-se uma avaliação prévia da possibilidade de reciprocidade, usando o termo de James Colleman.

Para Fukuyama, só as “boas condutas” produzem capital social. Os valores errados não. Portanto, considera que as normas para produzirem capital social devem incluir valores como: confiança e obrigações de reciprocidade. Uma questão que se levanta quando estudamos o tema será a de perceber qual, afinal, a sua utilidade e dimensão.

A este propósito, Fukuyama, entende, que estes comportamentos, avaliados no capital social, melhoram a eficiência dos indivíduos em sociedade, aumentando a coesão social, a obediência às leis e normas sociais, acabando por criar um predomínio vantajoso da cooperação sobre a competição, em todos os actos da vida pública.

Vimos que Kliksberg afirma que algumas medidas econométricas, já realizadas, são concludentes, em relação aos resultados positivos da aplicação de capitais nos actos sociais. Quanto mais capital social, mais crescimento económico a longo prazo, menos criminalidade, mais saúde pública e mais democracia.

Tem-se feito, também, um enorme esforço, para relacionar o capital social com o desenvolvimento económico, sobretudo a nível regional e local. A sua importância é, referida para aplicação destinada a desenvolver o grau de associativismo das populações, que parece submergir como um indicador para um desenvolvimento estável, do ponto de vista económico, político e social.

De acordo com Alejandro Portes o conceito de capital social pode ser directamente aplicado, no controlo social, apoio familiar e em benefícios familiares.

No entanto, a sua aplicação, não será ainda uma prática comum generalizada, por não estar ainda bem desvelado e acordado, pela comunidade científica, quanto a alguns aspectos, componentes, dimensões. Tem-se afigurado, sobretudo, mais difícil, a sistematização das medidas das variáveis de influência do capital social. O que nos faz concluir, que, mesmo que alguns autores o indiquem como um dogma, parece-nos que não há consenso suficiente sobre a matéria, para o podermos considerar como tal.

Para Sérgio Lazzarini, há uma relação directa entre o capital social e a “habilidade” das empresas, ou dos agentes, para gerar valor, a partir das redes e relações sociais em que se inserem. Será, então, importante perceber a capacidade dos cidadãos para se relacionarem. As redes de relações facilitam o espaço para a troca de informações entre as pessoas, criam espaços para a comunicação, com canais de informação e trocas de conhecimentos.

Num seu trabalho Social capital: The problem of Measurement, Francis Fukuyama, diz que o capital social se revelou uma condição essencial para uma transição para democracias estáveis na Europa ocidental. Na sua perspectiva, nos USA, o declínio do capital social tornou-se um problema muito sério para a democracia.

De acordo com Jacob Carlos Lima, o capital social tem sido amplamente estudado na sociologia norte-americana, para comprovar a evidente utilidade das redes sociais informais, na construção de formas de sociabilidade, em que se conjugam interesses individuais e colectivos.

O fenómeno do capital social é estudado, também, para facilitar trocas, onde o factor económico em vez de implícito, como será sempre, na perspectiva de Bourdieau, antes é explícito, e a base fundamental da troca. A este propósito, Fernando Curi Peres, numa análise micro-social, faz uma relação directa do desempenho da empresa com a sua capacidade para procurar informação e conhecimentos na rede de organizações em que se insere. Refere-se à existência de uma estratégia empresarial corporativa, consciente, se as relações entre empresas são estruturadas e feitas ao longo do tempo.

Para que haja estabilidade, dessas instituições, estas tendem a criar normas que permitem regular a sua manutenção. Citam-se, como exemplo, a declaração de insatisfação, perante comportamentos, a sua repressão, inibição e as sanções, posteriormente aplicadas.

Outro problema comum, de algumas das nossas sociedades, é a questão da integração de grupos de culturas minoritárias, em que o desenvolvimento do capital social poderá permitir a criação de laços e normas estáveis, que não conduzam à sua exclusão ou marginalização social.

Apesar de algumas das incertezas metodológicas que indicámos ao longo deste estudo, o conceito de capital social, relacionado, intrinsecamente, com diferentes áreas das Ciências Sociais, começa a ser unanimemente reconhecido como muito válido, e de importância, a não descurar para a sociedade.

Concluímos que o capital social, não é um conceito reconhecido de forma consensual, pela comunidade científica, embora, pareça poder ser considerado como um capital em termos económicos. Esta questão parece ser levantada por razões de natureza prático-cientifica, pela Economia, que se prendem com uma definição estável do conceito, com perfeito conhecimento das suas componentes, dimensões e variáveis. Esta estabilidade, bem como, a possibilidade de lhe aplicar medidas mais exactas, deverá vir a influenciar a sua maior credibilidade, junto da comunidade científica.

Apesar destes pressupostos, que se prendem com a necessidade de prudência no seu uso, o conceito de capital social, relacionado, intrinsecamente, com várias disciplinas das Ciências Sociais, começa a ser unanimemente reconhecido como muito válido e útil, pelo comum dos investigadores.

Em resposta à questão de o capital social, ser, ou não dever ser, um capital, diríamos, em conclusão, e por ora, que parece ser., um capital de investimento tão segurável, quanto maiores forem as normas de confiança.

O conceito de capital social não aspira a comutar os pesos dos factores económicos no desenvolvimento, antes evoca, como já dissemos, a necessidade de lhe apor normas das estruturas sociais que regem e marcam a estrutura económica.

A finalizar o trabalho, diremos que a questão do capital social nos conseguiu convencer. É um fenómeno que se assemelha a um polvo, que, na sociedade, estende os seus tentáculos para estratégias de desenvolvimento económico e políticas de acção pública. Nomeadamente relacionadas, com os comportamentos cívicos e combate à exclusão de grupos ou etnias, mas também, claramente, através de estratégias de empresas, que assumem novas posições no mercado.

O problema remete-nos, também, para a questão de uma sociedade demasiado reguladora, ser ou não ser, conveniente. Deixando antever, que é preciso medir com rigor a sua aplicação, que deve ser feita, na sociedade, de forma ponderada e cautelosa. Pois, se permitir que aconteça a exclusão, de grupos ou mesmo comportamentos, pode não ser uma boa medida, por outro lado, uma excessiva regulação, das normas comuns, pode levar a uma uniformização de comportamentos em que se torna difícil o emergir da diferença, que consubstancia a riqueza dos agregados. E este problema, parece-nos ser válido quer para os tecidos sociais, quer para as questões económicas, se é que, nesta altura, ainda é adequado, fazer a separação de ambos.

Encontrámos, com o capital social, um tema de investigação, de verdadeiro cariz interdisciplinar, em que, o conjunto das diferentes contribuições, das disciplinas de estudo, tem doado ao tema, um desenvolvimento de invulgar interesse. Apresentou-se-nos, assim, o conceito de capital social, com um ecletismo, que o tornou capaz, de o catapultar, para diversos temas de interesse, nos grandes sectores da sociedade, sejam eles relacionados, com o sector público, ou privado.

Lisboa, 29 de Fevereiro de 2004.

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Menezes e Castro Maria de Fátima de Carvalho. "Aproximação ao conceito de capital social". gestiopolis. noviembre 25, 2009. Consultado el . https://www.gestiopolis.com/aproximacao-conceito-capital-social/.
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